MAIS FUNDO QUE O TALHO
Tapado de judiaria
Uma dor que vem lá de dentro
Muito além do ferimento
Muito mais fundo que o talho
Como o estalar de um galho
Zunindo lá dentro da carcaça
Uma dor que não rechaça
A lembrança mais insistente
Do corte ainda latente
Do caçador que virou caça
Assim pensa o bagual
A pouco florão de tropa
Agora, a lo léo, galopa
Buscando um tempo passado
Escorado na aramado
Dos corredores do pensamento
Aflito, por um momento
Como vai ser daqui por diante
Nada será como antes
Sem emoção, sem sentimento
O tempo passa e não volta
Só temos o tempo de agora
A vida não aceita escora
Nem se trava com ferrolho
Aquilo que eu planto, colho
Se a semente for ruim
O que irá germinar, no fim
É aquilo que eu não queria
O que é bom se faz dia-a-dia
Espero pros outros o que quero pra mim
Mas afinal de contas
O que tá feito, tá feito
Já não tem outro jeito
A não ser viver com isso
No ontem, eu era petiço
Depois ponteiro de canchas retas
Por fim, bagual de cumprir metas
Agora, depois de um talho
Me deixaram no orvalho
Nas noites frias e quietas
Eu sei que bicho não tem direitos
Cumpre o que lhe é mandado
Mas pior que um soldado
É peça perdida na guerra
Que mesmo depois que encerra
Ninguém volta pra buscar
Querem é descartar
Como quem joga papel no lixo
Mas saibam que todo bicho
Gostaria de um dia voltar
E agora, meu parceiro
Te pergunto: O que foi que te fiz?
Pra me deixar infeliz
Em um segundo, pra todo e sempre
Nunca mais haverá semente
Numa dor que tonteia e dopa
No curativo, o sangue que ensopa
É o mesmo que correu em minhas veias
Quando te salvei de tantas peleias
Ponteando por entre a tropa.
Leandro da Silva Melo
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